A fila formada em frente à agência da Caixa Econômica Federal na manhã da quinta-feira passada, 31 de maio, era longa. Sob o sol intenso, incoerente com as nove horas da manhã, as pessoas buscavam os resquícios de sombra na calçada enquanto o local não abria as portas. Os dois pequenos buracos em uma parede da agência do Banco do Nordeste, do outro lado da rua, não eram percebidos por ninguém. Nenhuma pessoa parou e apontou para o local onde não existia mais reboco e a estrutura estava exposta. O que hoje passa despercebido são os últimos vestígios físicos do que nunca sairá da memória de muitos moradores de Macau.
Amanhã, completa-se 10 anos do assalto que teve uma das maiores repercussões da história do Rio Grande do Norte pela ousadia e violência que marcaram a ação. Foi no início da tarde de 4 de junho do ano de 2002 que a quadrilha liderada por José Valdetário Benevides e Francimar Fernandes Carneiro invadiu a cidade de Macau, a cerca de 180 quilômetros de Natal. Na parede do Banco do Nordeste, as marcas de dois dos muitos tiros disparados durante o roubo são as únicas marcas ainda não apagadas.
"Foi coisa de cinema, menino", relatou o comerciante Marcos Antônio da Silva, 54 anos. O roteiro não deixa que a declaração de Marcos seja inexata. Três agências bancárias da cidade - Banco do Brasil, Banco do Nordeste e Caixa Econômica Federal - foram invadidas simultaneamente e o dinheiro, levado. Estima-se que mais de R$ 500 mil tenha sido roubado das instituições financeiras. A ousadia ganhou marcas de violências, quando uma viatura ocupada por dois delegados da Polícia Civil, um agente e um sargento da Polícia Militar cruzou o caminho do bando.
Com mais de 15 integrantes, a quadrilha tomou a entrada da cidade e, armados com fuzis, metralhadoras e pistolas, possuía sentinelas nas esquinas próximas às agências bancárias - que ficam perto entre si. A viatura era conduzida pelo delegado Róbson Luiz de Medeiros Lira; no banco do passageiro vinha o delegado regional Antônio Teixeira dos Santos Júnior. A rajada de tiros disparada por um dos assaltantes pegou ambos de surpresa e tirou imediatamento a vida de Róbson, ainda deixando Teixeira ferido no braço e no rosto.
"Eles saíam das agências com sacos de dinheiro. Eles dominaram isso aqui todinho", disse o comerciante Marcos Antônio. O homem possui o ponto de venda de lanches há 20 anos e não se esquece de nenhum detalhe do que assistiu há 10 anos. "Fiquei escondido atrás dos cocos aqui. De repente chegou uma pessoa aqui batendo na janela. Era o vigilante que tinha sido feito refém e tinha vindo pegar água para os bandidos", afirmou.
O gerente do Banco do Brasil e o segurança da agência foram levados no carro do bando após o assalto e abandonados pouco tempo depois. Apesar de a ocorrência ter sido registrada há 10 anos, o caso ainda traz calafrios para muitos moradores da cidade. Um deles, que prefere ter a identidade preservada, ainda hoje é traumatizado. "Não gosto nem de lembrar. Só vou ao banco quando realmente é necessário. Se tivesse que definir aquele dia em uma palavra, seria 'terror'".
A pessoa entrevistada pela reportagem da TRIBUNA DO NORTE foi refém da quadrilha. Encontrava-se dentro da agência da Caixa Econômica, quando o local foi invadido. "Corri para dentro de uma salinha, com outros funcionários. Foi quando vi uma janelinha e pulei. Ela dava num corredor e saía na rua. Não pensei duas vezes", contou. O homem não esperava, no entanto, ser capturada assim que alcançasse a rua. "Um deles, encapuzado, me viu e me pegou pela camisa perguntando para onde eu ia. Respondi que queria ir pra casa".
O tempo sob poder do bandido, ele não se recorda. Mas o sofrimento ainda é latente. "Quando ele me soltou, disse para eu correr, mas não conseguia. Também disse para não olhar para trás. Mas já que ele ia me matar, olhei mesmo", disse. O homem depois correu e se abrigou em um supermercado.
Dispondo armas de grosso calibre, equipados com coletes à prova de balas e rádio comunicadores, a quadrilha ousada foi bem-sucedida, a princípio. Arnaldo Rodrigues Fernandes, Francisco Soares Padilha Neto, Wilson Gomes Bento, Carlos Alberto Valêncio da Silva, Arivan Veríssimo Barbalho, Alexandre Thiago Costa Silva, Marcos Aurélio Amador Alves, Arivone Gonçalves da Silva, Francisco Clésio do Nascimento Macedo, Luiz Chagas da Silva acabaram presos pelo envolvimento com o assalto. José Valdetário Benevides foi morto pela polícia em confronto registrado em 2003. Francimar Carneiro também foi alvejado e morto pela polícia durante assalto em Sergipe.
Sete dos 13 integrantes da quadrilha foram condenados a penas superiores a 107 anos de prisão.
Interior do Estado ainda permanece vulnerável
Dez anos após o registro de um dos assaltos de maior repercussão do Estado, o interior do Rio Grande do Norte permanece vulnerável. Melhoras foram constatadas e hoje, quadrilhas se arriscam com menor intensidade em ataques a bancos e outros tipos de crime. A criminalidade, no entanto, tem se moldado com base nas falhas do policiamento e investigação. Em vez dos antigos e recorrentes assaltos e invasões de cofres bancários, atualmente os alvos são terminais eletrônicos. Durante o ano de 2011, foram mais de 20 ataques com utilização de explosivos ou maçaricos para corromper caixas e alcançar a quantia de dinheiro.
Se o quantitativo não registrou aumento substancial, o qualitativo sim. Essa é a visão do major Fernandes, comandante da 1ª Companhia Independente da PM em Macau. "Não estamos no efetivo ideal, mas é o suficiente para o controle de ocorrências na região. Hoje em dia, o pessoal está bem mais qualificado do que naquela época", disse o oficial. A Companhia conta com o efetivo de 90 homens, dos quais 30 tiram serviço diariamente. Sob a jurisdição da PM em Macau também estão as cidades de Pendências, Guamaré, Alto do Rodrigues, Jandaíra e Galinhos. Equipes do Grupo Tático Operacional (GTO) prestam apoio no atendimento de ocorrências nessa região.
Diferente do município vizinho que dispõe de aparato da PM e da Polícia Civil, em Pendências a situação é precária e suscetível a assaltos. Na cidade de cerca de 14 mil habitantes, dois soldados e um sargento são responsáveis por toda a atividade policial. Além disso, também são responsáveis pela guarda de 23 presos detidos no destacamento. "Quando temos que atender alguma ocorrência, os presos ficam sozinhos. Mas em dia de visita, que temos que organizar aqui, não podemos sair para ocorrência alguma", esclareceu o sargento Telmo Glício Martins.
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